domingo, 31 de março de 2013


Para Chauí, ditadura iniciou devastação física e pedagógica da escola pública


Por: Paulo Donizetti de Souza, Rede Brasil Atual
Publicado em 30/03/2012, 08:30
Última atualização em 13/06/2012, 10:49

  
Para Chauí, ditadura iniciou devastação física e pedagógica da escola pública
"Você saía de casa para dar aula e não sabia se ia voltar, se ia ser preso, se ia ser morto. Não sabia." (Foto: Gerardo Lazzari/ Sindicato dos Bancários)
São Paulo – Violência repressiva, privatização e a reforma universitária que fez uma educação voltada à fabricação de mão-de-obra, são, na opinião da filósofa Marilena Chauí, professora aposentada da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, as cicatrizes da ditadura no ensino universitário do país. Chauí relembrou as duras passagens do período e afirma não mais acreditar na escola como espaço de  formação de pensamento crítico dos cidadãos, mas sim em outras formas de agrupamento, como nos movimentos sociais, movimentos populares, ONGs e em grupos que se formam com a rede de internet e nos partidos políticos. 
Chauí, que "fechou as portas para a mídia" e diz não conceder entrevistas desde 2003, falou à Rede Brasil Atual após palestra feita no lançamento da escola 28 de de Agosto, iniciativa do Sindicato dos Bancários de São Paulo que elogiou por projetar cursos de administração que resgatem conteúdos críticos e humanistas dos quais o meio universitário contemporâneo hoje se ressente.
Quais foram os efeitos do regime autoritário e seus interesses ideológicos e econômicos sobre o processo educacional do Brasil?
Vou dividir minha resposta sobre o peso da ditadura na educação em três aspectos. Primeiro: a violência repressiva que se abateu sobre os educadores nos três níveis, fundamental, médio e superior. As perseguições, cassações, as expulsões, as prisões, as torturas, mortes, desaparecimentos e exílios. Enfim, a devastação feita no campo dos educadores. Todos os que tinham ideias de esquerda ou progressistas foram sacrificados de uma maneira extremamente violenta.
Em segundo lugar, a privatização do ensino, que culmina agora no ensino superior, começou no ensino fundamental e médio. As verbas não vinham mais para a escola pública, ela foi definhando e no seu lugar surgiram ou se desenvolveram as escolas privadas. Eu pertenço a uma geração que olhava com superioridade e desprezo para a escola particular, porque ela era para quem ia pagar e não aguentava o tranco da verdadeira escola. Durante a ditadura, houve um processo de privatização, que inverte isso e faz com que se considere que a escola particular é que tem um ensino melhor. A escola pública foi devastada, física e pedagogicamente, desconsiderada e desvalorizada.
E o terceiro aspecto?
A reforma universitária. A ditadura introduziu um programa conhecido como MEC-Usaid, pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos, para a América Latina toda. Ele foi bloqueado durante o início dos anos 1960 por todos os movimentos de esquerda no continente, e depois a ditadura o implantou. Essa implantação consistiu em destruir a figura do curso com multiplicidade de disciplinas, que o estudante decidia fazer no ritmo dele, do modo que ele pudesse, segundo o critério estabelecido pela sua faculdade. Os cursos se tornaram sequenciais. Foi estabelecido o prazo mínimo para completar o curso. Houve a departamentalização, mas com a criação da figura do conselho de departamento, o que significava que um pequeno grupo de professores tinha o controle sobre a totalidade do departamento e sobre as decisões. Então você tem centralização. Foi dado ao curso superior uma característica de curso secundário, que hoje chamamos de ensino médio, que é a sequência das disciplinas e essa ideia violenta dos créditos. Além disso, eles inventaram a divisão entre matérias obrigatórias e matérias optativas. E, como não havia verba para contratação de novos professores, os professores tiveram de se multiplicar e dar vários cursos. 
"Fazer uma universidade comprometida com o que se passa na realidade social e política se tornou uma tarefa muito árdua e difícil"
Houve um comprometimento da inteligência?
Exatamente. E os professores, como eram forçados a dar essas disciplinas, e os alunos, a cursá-las, para terem o número de créditos, elas eram chamadas de “optatórias e obrigativas”, porque não havia diferença entre elas. Depois houve a falta de verbas para laboratórios e bibliotecas, a devastação do patrimônio público, por uma política que visava exclusivamente a formação rápida de mão de obra dócil para o mercado. Aí, criaram a chamada licenciatura curta, ou seja, você fazia um curso de graduação de dois anos e meio e tinha uma licenciatura para lecionar. Além disso, criaram a disciplina de educação moral e cívica, para todos os graus do ensino. Na universidade, havia professores que eram escalados para dar essa matéria, em todos os cursos, nas ciências duras, biológicas e humanas. A universidade que nós conhecemos hoje ainda é a universidade que a ditadura produziu. 
Essa transformação conceitual e curricular das universidade acabou sendo, nos anos 1960, em vários países, um dos combustíveis dos acontecimentos de 1968 em todo mundo.
Foi, no mundo inteiro. Esse é o momento também em que há uma ampliação muito grande da rede privada de universidades, porque o apoio ideológico para a ditadura era dado pela classe média. Ela, do ponto de vista econômico, não produz capital, e do ponto de vista política, não tem poder. Seu poder é ideológico. Então, a sustentação que ela deu fez com que o governo considerasse que precisava recompensá-la e mantê-la como apoiadora, e a recompensa foi garantir o diploma universitário para a classe média. Há esse barateamento do curso superior, para garantir o aumento do número de alunos da classe média para a obtenção do diploma. É a hora em que são introduzidas as empresas do vestibular, o vestibular unificado, que é um escândalo, e no qual surge a diferenciação entre a licenciatura e o bacharelato. 
Foi uma coisa dramática, lutamos o que pudemos, fizemos a resistência máxima que era possível fazer, sob a censura e sob o terror do Estado, com o risco que se corria, porque nós éramos vigiados o tempo inteiro. Os jovens hoje não têm ideia do que era o terror que se abatia sobre nós. Você saía de casa para dar aula e não sabia se ia voltar, não sabia se ia ser preso, se ia ser morto, não sabia o que ia acontecer, nem você, nem os alunos, nem os outros colegas. Havia policiais dentro das salas de aula.
Houve uma corrente muito forte na década de 60, composta por professores como Aziz Ab'Saber,  Florestan Fernandes, Antonio Candido, Maria Vitória Benevides, a senhora, entre outros, que queria uma universidade mais integrada às demandas da comunidade. A senhor tem esperança de que isso volte a acontecer um dia?
Foi simbólica a mudança da faculdade para o “pastus”, não é campus universitário, porque, naquela época, era longe de tudo: você ficava em um isolamento completo. A ideia era colocar a universidade fora da cidade e sem contato com ela. Fizeram isso em muitos lugares. Mas essa sua pergunta é muito complicada, porque tem de levar em consideração o que o neoliberalismo fez: a ideia de que a escola é uma formação rápida para a competição no mercado de trabalho. Então fazer uma universidade comprometida com o que se passa na realidade social e política se tornou uma tarefa muito árdua e difícil. 
"Esse é o momento também em que há uma ampliação muito grande da rede privada de universidades, porque o apoio ideológico para a ditadura era dado pela classe média"
Não há tempo para um conceito humanista de formação?
É uma luta isolada de alguns, de estudantes e  professores, mas não a tendência da universidade.
Hoje, a esperança da formação do cidadão crítico está mais para as possibilidades de ajustes curriculares no ensino fundamental e médio? Ou até nesses níveis a educação forma estará comprometida com a produção de cabeças e mãos para o mercado?
Na escola, isso, a formação do cidadão crítico, não vai acontecer. Você pode ter essa expectativa em outras formas de agrupamento, nos movimentos sociais, nos movimentos populares, nas ONGs, nos grupos que se formam com a rede de internet e nos partidos políticos. Na escola, em cima e em baixo, não. Você tem bolsões, mas não como uma tendência da escola.

Nova pesquisa, velhas frustrações


Nova pesquisa, velhas frustrações


Por Marcos Coimbra, na revista CartaCapital:

Nada dá certo para as oposições faz tempo. Elas tentam, se esforçam, mobilizam seus vastos recursos e as coisas não acontecem. Seu pior pesadelo parece prestes a se materializar.

A tomar pelo que dizem os eleitores, quando perguntados sobre como pretendem votar na próxima eleição, Dilma Rousseff se reelegerá sem grandes problemas. Prognosticar sua vitória não é difícil para quem conhece um mínimo da sociedade brasileira.

Ela tem tudo para vencer:

a) A “inércia reeleitoral”, que beneficia até governantes mal avaliados (quem não se lembra dos muitos governadores e prefeitos que, apesar de enfrentarem sérias dificuldades, terminaram vencendo?).

b) Faz um governo bem avaliado, aprovado por quatro em cada cinco brasileiros (quem preferiria mudar, estando satisfeito com o que tem? Se há uma coisa em que o eleitor acredita é que mais vale um pássaro na mão do que dois voando).

c) Tem uma imagem pessoal muito positiva, é querida pela ampla maioria dos eleitores, que gostam de seu jeito de ser e se portar como presidenta (algum de seus possíveis adversários chega sequer perto do que ela alcança no julgamento da atuação pessoal?).

d) É conhecida e aprovada pela quase totalidade do eleitorado, não precisa perder tempo para se apresentar ao País (qual de seus oponentes em potencial pode dizer o mesmo, uma vez que todos existem em nichos regionais ou ideológicos?).

Confirmado o favoritismo, Dilma será a quarta chefe de governo eleita pelo PT em sequência. Ao cabo de seu segundo mandato, chegaremos a 16 anos de hegemonia petista na política brasileira.

O que será da atual geração de lideranças oposicionistas em 2018? Quantas estarão ainda em condições de atrair a atenção dos eleitores? Quantos de seus jovens terão envelhecido? Quantos dos atuais “formadores de opinião”, na mídia conservadora, estarão ainda na ativa? (A maioria é tão velha que, entre aposentados e falecidos, é possível que restem poucos).

A gravidade do quadro que as oposições enfrentam voltou a ser confirmada na semana passada, quando uma nova pesquisa do Datafolha a respeito da sucessão presidencial foi divulgada. Ela não trouxe novidade em relação ao que se sabia desde o início de 2012. Exatamente por isso, foi uma ducha de água fria no ânimo dos partidos da oposição e nos segmentos “antilulopetistas” da opinião pública.

Apesar dos esforços diários e da militância radicalizada da mídia de direita, Dilma fica cada vez melhor na corrida eleitoral. Enquanto isso, seus adversários patinam ou retrocedem. Entre dezembro de 2012 e março deste ano, ela foi de 54% a 58%, na vizinhança dos 60%, patamar onde outras pesquisas já a haviam colocado. Marina Silva (sem partido) e Aécio Neves (PSDB-MG) perderam 2% cada um, ela de 18% para 16% e ele de 12% para 10%.

Mais frustrante para a mídia foi, no entanto, o modesto crescimento do governador de Pernambuco, Eduardo Campos. Depois de “bombado” incessantemente na mídia, foi de escassos 4% a escassos 6%.

Uma simples aritmética mostra que os três não mudaram seu tamanho total: somavam 34%, em dezembro, e foram a 32%, em março. No máximo, o que teria ocorrido seria uma pequena reacomodação no terço do eleitorado que não pretende votar na presidenta: Campos tirou uma lasquinha de Marina e de Aécio.

Em votos válidos (a conta relevante para especular sobre vitórias em primeiro turno), Dilma teria, hoje, perto de 64%. Muito próximo de alcançar, sozinha, o dobro da soma dos demais.

Significa que “já ganhou”, que vencerá no primeiro turno? Claro que não, e seria um equívoco se sua assessoria interpretasse assim a pesquisa. Mas que os resultados do Datafolha foram uma decepção para as oposições, disso não há dúvida.

O que lhes resta fazer?

O circo armado em torno do julgamento do “mensalão” foi inútil do ponto de vista eleitoral. O PT não perdeu espaço em 2012 e nada indica que será afetado em 2014.

A tese da incompetência gerencial da presidenta, à qual se dedicaram assim que perceberam o insucesso anterior, não tem adeptos na maioria da opinião pública. Ao contrário, os brasileiros se mostram cada vez mais satisfeitos com o desempenho do governo.

A valorização dos possíveis adversários não comove os eleitores de Dilma. Campos, seu mais dileto produto na atualidade, permanece com números de nanico.

Quando pesquisas como essa são publicadas, ficam tristes e devem pensar no “povinho” que Deus pôs no Brasil. O problema é que não podem trocá-lo. Ou será que vão procurar prescindir dele na hora de decidir quem vai mandar?

Demissões e juros altos é política neoliberal


CUT apoia declaração de Dilma que colocou desenvolvimento econômico e emprego em primeiro lugar


Escrito por: Vagner Freitas, presidente Nacional da CUT

A recente declaração da presidenta Dilma Rousseff, de que não concorda com políticas de combate à inflação baseadas em redução do crescimento econômico, intensificou as tentativas de setores da mídia e do mercado financeiro de impor a agenda de defesa de contenção do consumo interno e do crédito e do aumento de demissões e das taxas de juros, derrotada nas eleições.

Ao contrário do que foi divulgado, a declaração da presidenta se baseia nas projeções do Banco Central de que o IPCA – IBGE irá atingir índices próximos de 5,7% em dezembro de 2013 (informação divulgada pelos meios de comunicação no dia 27 de março de 2013), ou seja, inferior ao verificado no ano anterior. Portanto, em nenhum momento se considerou que a inflação do ano ultrapassaria o teto de 6,5% definido pelo regime de metas de inflação.

Além disso, a experiência de aumento da taxa de juros para combater um “possível descontrole inflacionário”, no início de 2011, desestimulou o crescimento econômico, que só voltou a dar sinais de recuperação nos últimos 2 meses. Um aumento de juros, como defende o mercado financeiro, além de eficácia duvidosa, carrega um alto custo social e econômico e pode abortar as expectativas de crescimento para este ano.

A CUT acredita que uma política de elevação das taxas de juros atenta contra o desenvolvimento sustentável, gerador de emprego e renda, reduz o mercado interno, encarece o crédito e serve apenas aos interesses do capital especulativo. A natureza recente da inflação, concentrada principalmente nos preços dos alimentos e dos impactos sazonais de correções dos preços administrados (como tarifas de transporte, entre outros), muitos comuns no início do ano, tendem a se dissipar no decorrer do ano. Ambos os fatores não têm qualquer relação com uma “pressão de demanda” na economia brasileira. Ou seja, um aumento de juros causará redução da economia, do emprego, dos salários e na demanda interna.

Aumentar os juros significa aumentar as despesas públicas, uma vez que aumenta sua conta financeira (seus gastos com juros da dívida). A saída mais eficiente é a ampliação dos investimentos em infraestrutura e redução das desigualdades sociais.

Por fim, a CUT defende que medidas como a desoneração dos itens da cesta básica também devem incluir impostos estaduais e municipais; que deve haver uma atuação da Companhia de Nacional de Abastecimento (CONAB) mais presente através de estoques reguladores para estabilização dos preços ao consumidor. E mais: não se pode deixar de dar atenção aos crescentes movimentos de concentração de mercado ocorridos no país (através de fusões e aquisições, que ocorre via Conselho Administrativo de Defesa Econômica - CADE), principalmente no que diz respeito ao poder de mercado e dinâmica de preços. Além disso, a CUT defende a desindexação de contratos e tarifas públicas.

Todas estas medidas seriam mais eficientes para conter a inflação sem interromper o processo de crescimento que se desenha para 2013 porque atuaria em fontes estruturais do processo inflacionário, o que proporcionaria uma eficácia muito maior em seu combate do que o velho (e falso) dilema entre crescimento econômico ou estabilização, presente há muito tempo no centro do debate de política econômica do país, mas que interessa apenas a uma diminuta (e especuladora) parte dos agentes econômicos.

Por tudo isto, a CUT apoia a declaração feita pela presidenta Dilma Rousseff  nesta quarta-feira (27), em Dubai, durante a reunião dos BRICS, de que não concorda com medidas de desaquecimento da economia para combater a inflação
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A HERANÇA COLONIAL DO MEDO





Hoje é dia 31 de março de 2012. O dia de lembrar o sentimento de impunidade e impotência que assolou o país durante anos. Um dia que não podemos esquecer jamais. Em 1964, nessa data, perpetrou-se a consumação do Golpe Militar que a partir de 1º de abril deixaria o Brasil envolto numa aura de violência, estupidez e terror. A motivação dessa bestialidade armada se deu pelo medo. 

O medo do novo, o medo da renovação e da liberdade para um povo que não podia nem devia ter sua própria forma de ver o mundo e seu próprio jeito de construir suas vidas.

A colonialidade do poder fechou os caminhos de todos nós durante 564 anos. Sua face grosseira e covarde fez-se mais arrogante e autoritária nos anos de chumbo da ditadura militar e ainda agora coloca as garras de fora num momento particular onde a maturidade e o sentimento de emancipação estão fortes. 

O que faz militares usarem tortura, abuso e terrorismo contra civis? O que faz a polícia militar usar gás de pimenta, cassetete, choque e espancamento numa manifestação popular ou numa greve de trabalhadores? É o mesmo sentimento que faz agentes penitenciários maltratarem e espancarem presos, tratando-os como se fossem lixo humano. 

As mesmas motivações que fazem com que jovens adolescentes espanquem e coloquem fogo em mendigos  ou roubem e matem por dinheiro. São as mesmas reações que fazem com que haja o preconceito e a agressão do outro pela simples diferença no pensar, no portar-se e nas escolhas de vida. 

O medo... O que faz com que a sociedade prefira tratar a violência com mais violência, a truculência com mais truculência e a desumanidade com mais desumanidade? A cultura do medo tem condicionado nossa forma de agir. O medo fabrica o crime e a perversão.

 Um país que foi colonizado dentro de uma visão civilizatória de expropriação de sua própria história, a partir de uma cultura escravocrata, é um país onde o medo grassa, com todos os contornos infelizes das sensações que causa. 

Todas as pessoas que agem de forma violenta têm medo! Medo de si mesmas, medo da transformação, medo da liberdade e da responsabilidade da assunção de suas fraquezas.

 Como não podem se surrar e se bater faz-no em quem joga na sua cara a sua castração e o seu medo de ver-se. Querem castigar quem afronta seus recalques e frustrações.

 A herança colonial do Brasil vem custando caro a todos nós há muitos anos. Urge superarmos essa dependência. 

É preciso confrontar todos os medos, todas as agruras, toda a violência que durante todo esse tempo ainda permanece fazendo parte de nós. 

Um povo que não conhece sua história é um povo que não conhece o seu poder. A abertura dos arquivos da ditadura é essencial para fazer essa catarse necessária à nossa subjetividade.

 Opressores e oprimidos precisam se enfrentar e enfrentar seus medos e suas marcas. Não dá mais para fingir ou nos iludirmos de que pouco ou nada aconteceu. 

A punição para os crimes ocorridos será um modo exemplar de fazer com que todos os atores desse processo reconheçam suas dores, sua morbidez e seu recalque. 

Para sermos outros temos que virar a página definitivamente dessa história. Assim, hoje 31 de março temos que lembrar nossa liberdade, nossa superação, nossa força de transformação.

 Não há o que ser comemorado como queriam os militares do Clube Militar, mas, há o que se pensar e, principalmente, o que se fazer para que esse capítulo de nossa história seja um aprendizado para as próximas gerações, para que o medo nunca mais faça vítimas e para que a consciência política que estamos desenvolvendo traga paz agora e no futuro.


O poder Judiciário


“O poder Judiciário teme muito os grandes jornais", diz Comparato


O Jornal Unidade entrevistou o jurista Fábio Konder Comparato, professor doutor titular aposentado da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Entre os assuntos, ele discorreu sobre mídia, judiciário e ditadura na América Latina. "Durante o regime militar daqueles países do Cone Sul, o Poder Judiciário foi afastado. Ele entrou em hibernação. E nós mantivemos o Poder Judiciário funcionando sob o tacão e a espada do Poder Militar. Isso é realmente uma vergonha nacional", lamenta.



Comparato, que é doutor em Direito pela Universidade de Paris e doutor Honoris Causa da Universidade de Coimbra, avalia que alguns países latino-americanos têm legislações no setor de comunicação mais avançadas do que o Brasil devido ao caráter de seu povo.

"Isso corresponde à diferença de caráter entre os brasileiros e os demais povos hispano-americanos. O brasileiro tem caráter dúplice. Ele é fundamentalmente ambíguo. Ele tem uma aparência de respeito à Democracia, aos poderes constituídos. E, na verdade, há uma dominação capitalista dos empresários sobre os poderes públicos. Já no caso dos povos hispano-americanos, eles são muito mais claros e definidos nas suas opções. Inegavelmente, os regimes militares argentino, uruguaio e chileno foram mais cruéis que o regime brasileiro, o que não significa que tivemos uma “ditadranda”, opina o jurista. Acompanhe abaixo a íntegra da entrevista. 


Unidade: Qual a sua análise sobre o poder dos meios de comunicação no Brasil. O senhor acredita que a Justiça brasileira tem atuado em benefício dos grandes veículos de imprensa?
Fábio Konder Comparato:
 Evidentemente, em todos os países capitalistas, os grandes meios de comunicação de massa se tornaram um poder concorrente ao poder estatal. E, de acordo com o espírito do capitalismo, este poder é exercido de modo oculto e dissimulado. Os grandes jornais, rádios, televisões nunca dizem que tem algum poder sobre o mercado ou sobre a esfera política. Mas, na verdade, este poder é exercido e a apresentação dos veículos de comunicação de massa como órgãos que obedecem a lei e que não fazem censura é profundamente falsa. Mas quem foi que aprovou a lei? Não foram aqueles que obedecem ao poderio dos grandes meios de comunicação de massa? E estes meios de comunicação empresariais de massa são contrários à censura? Eles mesmos exercem uma censura brutal em seu âmbito de atuação.

Unidade: Como o sr. vê o fim da Lei de Imprensa. Que consequências esta decisão do STF tem para a sociedade brasileira?FKC: A meu ver, todos os poderes públicos estão hoje submetidos à influência dominante dos grandes meios de comunicação de massa. O Poder Judiciário, em especial, teme muito os grandes jornais, as grandes televisões. E eu mesmo fui vítima de um caso paradigmático. Em fevereiro de 2009, o jornal Folha de S. Paulo, publicou um editorial no qual, comparando o regime militar brasileiro com outros regimes militares da América Latina, sobretudo do Cone Sul, afirmava que no Brasil havíamos tido uma “ditabranda”. Como eu não leio editoriais, eu só tomei conhecimento dele no dia seguinte, por que um leitor do jornal, de Minas Gerais, mandou uma carta onde se dizia indignado com este neologismo. Eu, então, cedendo a meu impulso siciliano, enviei uma carta ao jornal na qual dizia claramente que o diretor de redação e o jornalista que redigiu o editorial deveriam ambos pedir desculpas ao povo brasileiro de joelhos em praça pública. É que eles ofenderam gravemente a consciência do povo brasileiro. Eles poderiam publicar ou não publicar a minha carta. Hoje esta possibilidade de não publicar se tornou muito forte. Por que, desde 2009, é que não existe mais Lei de Imprensa no Brasil.

Unidade: O sr. sofreu alguma represália por ter escrito esta carta à Folha de S. Paulo?
FKC: Sim. O jornal publicou a minha carta. Mas publicou embaixo da carta uma nota da redação dizendo que “o professor Fábio Konder Comparato é cínico e mentiroso, por que nunca criticou outros regimes ditatoriais como o cubano”. Para grande infelicidade do jornal, o então ombudsman do jornal, Carlos Eduardo Lins e Silva, publicou uma nota em que dizia que aquela nota da redação continha um “equívoco”, por que o professor Comparato, em uma edição da mesma Folha, tinha publicado uma carta criticando o regime cubano. Evidentemente que o ombudsman foi convidado a se retirar. Confesso que fiquei muito abalado. Mas, uma publicação dessas, na época o jornal de maior circulação, dizer que eu era cínico e mentiroso me abalou muito. Então, eu movi uma ação por danos morais. Eu perdi em primeira instância e perdi no Tribunal por unanimidade. 

Unidade: O sr. acredita que tenha perdido por qual motivo. Pelo temor dos juízes de confrontar um veículo de comunicação?FKC: Eu acho que sim, mas há também o fato do jornal ter se utilizado de um ex-desembargador para convencer os seus antigos pares de que deveriam votar contra mim. Eu entendo que esta posição do Tribunal foi de grande fraqueza. Eu não fiz a defesa pessoal no meu caso. Mas, se tivesse feito, subiria à tribuna e começaria dizendo: “Senhores desembargadores. Vossas Excelências são cínicos e mentirosos. E, diante do tumulto que isso ocasionaria, eu diria: foi exatamente esta reação que tive quando recebi estes epítetos.

Unidade: Como o sr. analisa o papel da imprensa no Brasil? Alguns colegas chegam a chamar a imprensa como Partido da Imprensa Golpista (PIG). O sr. acredita que a imprensa se preste a este papel?FKC: Eu não tenho opinião sobre isso. Eu tenho uma convicção. Tanto que eu tomei a iniciativa da propositura de uma Ação de Inconstitucionalidade por omissão no Supremo Tribunal Federal. E a razão é simples: a nossa Constituição Federal foi promulgada no dia 5 de outubro de 1988 e até hoje, passados mais de 24 anos, o Congresso Nacional não regulamentou dispositivos fundamentais da Constituição como, por exemplo, a proibição do monopólio e do oligopólio. Para dar um exemplo, a Rede Globo é a quarta maior rede de televisão mundial. O Congresso Nacional deixou de regulamentar o artigo 221 da Constituição que determina que a programação das emissoras de TV e de rádio obedeça alguns princípios fundamentais como preferência às matérias de conteúdo cultural, educativo e artístico. Essa ação foi apresentada ao Supremo Tribunal Federal em nome do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL)e também da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Comunicação e Publicidade. E eu quero assinalar o fato que a Presidência da República, por meio do advogado geral da União, deu parecer contrário a esta ação, ou seja, confirmou que os poderes da República são submetidos à influência dominante dos meios de comunicação de massa. Mas a Procuradoria Geral da República deu parecer favorável. E nós estamos aguardando a decisão.

Unidade: O sr. chegou a acompanhar o que acontece na Argentina e no Equador em relação às empresas de comunicação. Os países da América Latina estão mais evoluídos em relação à regulamentação da mídia?FKC: Isso corresponde à diferença de caráter entre os brasileiros e os demais povos hispano-americanos. O brasileiro tem caráter dúplice. Ele é fundamentalmente ambíguo. Ele tem uma aparência de respeito à Democracia, aos poderes constituídos. E, na verdade, há uma dominação capitalista dos empresários sobre os poderes públicos. Já no caso dos povos hispano-americanos, eles são muito mais claros e definidos nas suas opções. Inegavelmente, os regimes militares argentino, uruguaio e chileno foram mais cruéis que o regime brasileiro, o que não significa que tivemos uma “ditadranda”. Durante o regime militar daqueles países do Cone Sul, o Poder Judiciário foi afastado. Ele entrou em hibernação. E nós mantivemos o Poder Judiciário funcionando sob o tacão e a espada do Poder Militar. Isso é realmente uma vergonha nacional. Pois bem, terminados os regimes militares no Brasil e no Cone Sul, nós promulgamos uma Lei de Anistia e até hoje os assassinos, torturadores e estupradores do regime militar não foram sequer indiciados, sem falar em condenação penal. Enquanto que nesses outros países, por exemplo, como na Argentina, mais de 100 militares já foram condenados. E antigos chefes de Estado estão na cadeia até hoje. 

Unidade: Quais as alternativas que o sr. aponta para que a sociedade brasileira possa fazer frente ao grande poderio que as empresas de comunicação possuem no nosso país?FKC: Eu acho que a principal missão hoje de todos aqueles que querem resgatar a honra deste país e instituir um regime claramente republicano e democrático, consiste em lutar contra o oligopólio empresarial dos meios de comunicação de massa. E isso tem que ser feito de forma organizada. Por exemplo, existe um setor da Comunicação Social que não foi oligopolizado pelo capitalismo, que é a internet. E nós temos que trabalhar neste setor para mostrar a generalidade da opinião pública e, sobretudo, aos jornalistas e às novas gerações, que este poder capitalista sobre os meios de comunicação de massa é absolutamente contrário à dignidade da pessoa humana. No momento em que desmoralizamos os titulares do poder, eles começam a cair. Não se trata de fazer revoluções. Trata-se simplesmente de mostrar como eles são sujos, da cabeça aos pés. E eu acho que isso deve ser feito. E eu acho que vocês jornalistas têm muito mais capacidade do que nós, não jornalistas, para organizar isso.

Fonte: Jornal Unidade (foto: Levante Popular da Juventude)

sábado, 30 de março de 2013

Aécio não declara nenhum carro em seu nome, mas Joaquim Barbosa coloca culpa no banco por ocultação de bens

Oficialmente, o "pobre" Aécio Neves (PSDB-MG) nem sequer tem carro, conforme declaração de bens ao TSE. Na vida real, leva uma vida nababesca usando uma frota de carros importados de alto luxo, cujas despesas são descarregadas na rádio de sua propriedade, num suposto caso clássico de ocultação de patrimônio e sonegação fiscal.




O presidente do STF, Joaquim Barbosa, criticou os bancos, chamando-os de "lenientes" com a lavagem de dinheiro. Longe de mim defender os bancos que, muitos, não querem nem saber se o dinheiro é sujo ou limpo, querem saber é de lucrar. Mas a crítica está completamente fora de foco para quem é a autoridade máxima do poder judiciário. 

Reclamar de bancos que seriam coniventes em casos de lavagem de dinheiro é como reclamar de um traficante de armas por traficar armas, pedindo para ele ser bonzinho e fiscalizar a si mesmo para não cometer crimes.

De nada adianta dizer isso, se quem deve reprimir e dissuadir os crimes for leniente, e ficar empurrando a responsabilidade para os outros.

Se os bancos são lenientes é porque é o próprio Judiciário e o Ministério Público estão sendo lenientes com os bancos. Afinal no que resultou a descoberta da "lavanderia" do Banestado? Meia dúzia de bagrinhos foram pegos, mas os tubarões escaparam impunes. E a Privataria Tucana? E o caso Alstom da propina a tucanos paulistas, que anda rápido nos tribunais europeus e a passos de tartaruga nos tribunais brasileiros? E a operação Satiagraha e a Castelo de Areia? Está nas mãos do STF julgar se as provas são válidas. Por que não coloca em julgamento e faz o processo andar?

Que culpa tem um gerente de banco se uma empresa, que ele não conhece, com CNPJ e Contrato Social na Junta Comercial regular e sem nada desabonador, abre uma conta de pessoa jurídica e movimenta a conta? 

Como um gerente de banco honesto iria saber se aquela empresa seria "laranja" do bicheiro Carlinhos Cachoeira, por exemplo, ou se exerce atividades legítimas quando movimento a conta? Cabe ao banco avisar ao COAF de movimentações a partir de determinado valor ou suspeitas, como manda a lei, e todos os bancos fazem isso até de forma automática, informatizada. Já o Procurador Geral da República tinha a faca e o queijo na mão desde 2009, a partir da Operação Monte Carlo da Polícia Federal para desbaratar a quadrilha do bicheiro, mas deixou engavetada durante todo o ano de 2010 e 2011. 

Quem foi "leniente" neste caso? O banco ou o Procurador Geral?

O ministro Joaquim Barbosa falou também em ocultação de valores:

"Enquanto instituições financeiras não visualizarem a possibilidade de serem drasticamente punidas por servirem de meio para a ocultação da origem ilícita de valores que se encontram sob a sua responsabilidade, persistirá o estímulo à busca do lucro, visto como combustível ao controle leniente que os bancos fazem sobre a abertura de contas e sobre a transferência de valores", disse.

Daí chegamos a outro caso. O senador Aécio Neves (PSDB-MG) foi pego em flagrante numa blitz de trânsito no escândalo do bafômetro, na madrugada de 17 de abril de 2011. O que seria apenas uma infração de trânsito ao se recusar a soprar o bafômetro (grave, uma vez que dirigir alcoolizado coloca vidas em risco), abriu uma caixa de pandora com fortíssimos indícios de ocultação de patrimônio e sonegação fiscal.

A partir da placa do veículo de luxo Land Rover multado, descobriu-se que a rádio Arco-Íris do tucano, tem uma inusitada frota de veículos de luxo. Um deles era o usado pelo senador na balada no Rio de Janeiro na madrugada do bafômetro, nada tendo a ver com veículo de trabalho de uma rádio em Belo Horizonte. Qualquer auditor fiscal principiante imediatamente identifica no fato o clássico método de sonegação fiscal, de jogar despesas pessoais em despesas da empresa, para diminuir o lucro em vez de pagar imposto de renda.

Além disso, há o claro indício da ocultação de patrimônio pessoal na empresa, a ponto do tucano nem sequer declarar nenhum carro como bem pessoal. Isso tudo gera a obrigação do Procurador Geral investigar se não há algum tipo de lavagem de dinheiro por trás, tamanhas são as suspeitas geradas pelos próprio fatos.

Os deputados estaduais de Minas Gerais apresentaram representação pedindo investigaçãodestes fatos ao Procurador Geral da República há quase dois anos, e até hoje só tiveram resposta de que estava na gaveta, sem providências. E aguardam uma abertura de inquérito até hoje. Repetindo: há quase 2 anos!

Enquanto isso, o IPVA, o seguro, a manutenção, talvez o financiamento, se houver, a depreciação da frota de luxo, tudo isso e sabe-se lá mais o quê continua sendo pago nas contas bancárias da rádio, em vez de ser pago com a renda pessoal APÓS pagar impostos, como tem que fazer qualquer trabalhador honesto. 

Que culpa tem o banco disso? É o banco ou o Procurador Geral que está sendo "leniente"?

Não Preciso Provar nada para Ninguém

"Eu não tenho que medir esforços em provar nada a ninguém.

Não preciso provar a minha força nem se sou capaz de suportar.

Não preciso usar de desculpas, nem medir palavras para dizer o que penso.Eu preciso provar apenas a mim mesma,de que não posso desistir,de que tenho forças para aguentar a pressão que é viver,que é lutar e persistir.

Preciso provar para mim, que a minha alma tem grandeza, e que ...está pronta para suportar as melhores e piores experiências da vida,que sou capaz de admitir os meus erros,minhas falhas e minhas fraquezas, que as minhas virtudes realmente fazem diferença pra mim,e que a pessoa que eu sou é fruto de tudo o que de fato acredito e escolho pra mim.

Não preciso provar o quanto sou obstinada em buscar a minha felicidade, e o quanto vivo focada nos meus sonhos.

Preciso apenas provar para mim mesma, que sou um ser humano de valor,que faz a diferença para as pessoas e com a perspicácia necessária para crescer com sabedoria e serenidade,elementos tão essenciais para a alma.

Não preciso provar pra ninguém a grandeza da minha alma.

Preciso provar apenas pra mim,que o meu amor para com a vida e as pessoas é que me tornam grande.

Não é o que os outros avaliam ou acham, mas sim o acredito em mim é o que realmente conta e se torna importante!!
Bom então cheguei a conclusão que :

"SOU O QUE SOU" e não preciso provar para ninguém . Preciso só acreditar em mim. Assim não corro o risco de me tornar o que as pessoas esperam de mim e perder a essência da minha alma!

sexta-feira, 29 de março de 2013

Resenha: A águia e a galinha. (Leonardo Boff)


Escrito por Cátia Manoela Gasparetto

A presente obra divide-se em sete capítulos, onde conta à história de uma águia criada como uma galinha. Essa história é compreendida como uma metáfora da condição humana. Cada um poderá lê-la e interpretá-la conforme o chão que os seus pés pisam. Essa obra sugere caminhos, mostra uma direção e projeta um sonho promissor.

O autor Leonardo Boff, em 1938, formou-se em Teologia e Filosofia no Brasil e na Alemanha. Durante mais de vinte anos foi professor de Teologia Sistemática no Instituto Teológico Franciscano de Petrópolis. Por vários anos esteve à frente do editorial religioso da Editora Vozes. Junto com outros ajudou a formular a Teologia da Libertação, que por causa desta teve conflitos com a Igreja Católica, sendo proibido de dar aulas por um determinado período e a fazer um ano de silêncio. Mais tarde foi professor de Ética e Filosofia da Religião na Universidade do Estado do Rio de Janeiro. É autor de mais de sessenta livros ligados à teologia, à filosofia, à espiritualidade e à ecologia, em sua grande maioria publicados pela Editora Vozes. É membro da Comissão da Carta da Terra. Em 2002, em razão de seu compromisso com o direito dos pobres, ganhou o prêmio Nobel alternativo para a paz.

Ao ler a obra você vai se confrontar com duas dimensões fundamentais da existência humana: a dimensão do enraizamento, do cotidiano, do limitado, que seria o símbolo da galinha e a dimensão da abertura, do desejo, do ilimitado, o qual seja o símbolo da águia. A partir disso o autor nos questiona em como equilibrar essas duas dimensões. E como impedir que a cultura da homogeneização afogasse a águia dentro de nós e nos impeça de voar.

Para dar uma resposta convincente a esses desafios, o autor visita a moderna cosmologia, a nova antropologia, a psicologia profunda, a ecologia, a espiritualidade e a mística. O resultado é uma reflexão instigante que provoca entusiasmo na busca da identidade humana através da inclusão das contradições e da superação dos eventuais obstáculos a nível pessoal, social e planetário.

A história da águia e a galinha evoca dimensões profundas do espírito, indispensáveis para o processo de realização humana: o sentimento da autoestima, a capacidade de dar a volta por cima nas dificuldades quase insuperáveis, a criatividade diante de situações de opressão coletiva que ameaçam o horizonte da esperança.

Mas não podemos nos limitar a sermos somente galinha ou somente águia. Como galinhas somos seres concretos e históricos, mas jamais devemos esquecer nossa abertura infinita, nossa paixão indomável, nosso projeto infinito, nossa dimensão águia. Se não buscarmos o impossível (a águia) jamais conseguiremos o possível (a galinha).

Cada ser humano tem uma estrutura básica que se manifesta mais como a águia em alguns, mais como a galinha em outros. Cada um precisa escutar essa natureza interior, captar a águia que se anuncia ou a galinha que emerge. Após escutá-las, importa usar a razão para ver claro e o coração para decidir com inteireza. Somente assim se conquistará a promessa de um equilíbrio dinâmico.

A história da águia e da galinha nos evoca o processo de personalização pelo qual todo ser humano passa. Não recebemos a existência pronta. Devemos construí-la progressivamente. Há uma larga tradição transcultural que representa a caminhada do ser humano, homem e mulher, como uma viagem e uma aventura na direção da própria identidade.

Recusamo-nos a ser somente galinhas. Queiramos ser também águias que ganham altura e que projetam visões para além do galinheiro. Acolhemos prazerosamente nossas raízes (galinha), mas não à custa da copa (águia) que mediante suas folhas entra em contato com o sol, a chuva, o ar e o inteiro universo. Queremos resgatar nosso ser de águias. As águias não desprezam a terra, pois nela encontram seu alimento. Mas não são feitas para andar na terra, senão para voar nos céus, medindo-se com os picos das montanhas e com os ventos mais fortes.

Hoje, no processo de mundialização homogeneizadora, importa darmos asas à águia que se esconde em cada um de nós. Só então encontraremos o equilíbrio. A águia compreenderá a galinha e a galinha se associará ao voo da águia.

Ao final do livro, o autor apresenta a bibliografia de alguns títulos em português que ajudarão o leitor no aprofundamento da metáfora da águia e da galinha, entre eles; BARRÈRE, Martine. Terra. Patrimônio comum. São Paulo, Nobel, 1995; BOFF, Leonardo. Ecologia: grito da Terra, grito dos pobres. São Paulo, Ática, 1995; BONAVENTURE, Leon. Psicologia e mística. Petrópolis, Vozes, 1978; e outros.

A obra nos traz uma compreensão de que cada ser humano tem suas próprias dimensões e devemos respeitar cada uma delas. Há momentos em nossa vida que devemos articular as relações e realizar a síntese a partir da realidade da águia e em outros, a partir da realidade da galinha.

Na nossa atual humanidade e em nosso planeta, assistimos aos mandos e desmandos dos mais fortes, dos detentores do saber, do ter e do poder, que querem controlar, para nos reduzir a simples galinhas e nos subordinar aos seus interesses, mas é preciso que não aceitemos essa submissão, que rejeitemos os conformismos, os comodismos, porque essa dominação sempre será causadora de muitos sofrimentos à maioria da humanidade diante da pobreza e da exclusão social, por isso é necessário que despertemos a águia que existe dentro de nós para juntos construirmos um mundo melhor, onde todos possam participar e decidir sem omissões, libertando-se da opressão.