(Os fabricantes de Frankensteins)
Por : Francisco Costa
Anteontem, um motorista e segurança da Câmara dos Deputados
agrediu a um deputado, de 67 anos, e o colocou no hospital.
A princípio, por princípio, desaprovo, sou contra, é
covardia um homem novo, forte, praticante de lutas, agredir um velho.
Mas algumas coisas me levam a esperar mais, para emitir um
juízo político com mais convicção, por alguns motivos: o deputado, Takayama
(PSC), é pastor, da tropa de choque de Eduardo Cunha, Magno Malta e Marco
Feliciano, pessoas agressivas; os que assistiram a briga afirmam que foi por
causa de manobras de carros, na porta do Congresso, que Nakayama gritou com o
motorista, este respondeu com uma ofensa e, a partir daí Nakayama, certamente
por ser autoridade ou já ter idade, se sentir impune, agrediu primeiro,
tornando-se vítima do revide; o senador Delcídio Amaral (PT-MS) emitiu nota
defendendo o motorista e a oposição caiu de pau no senador, o que aponta para
uma história mal contada e que precisa ser esclarecida.
Mais um indício de que há alguma coisa estranha é que o deputado
não formalizou queixa à polícia, mas, como o Estatuto do Idoso preconiza que
agressão a idoso é crime de âmbito público, Eduardo Cunha fez a denúncia,
indiciando o motorista.
Corta!
Velório do ex deputado, ex senador, ex governador, ex
presidente da Petrobrás, ex ministro e ex presidente do PT, uma voz combativa e
altamente patriótica, sem que sobre ele nunca houvesse dúvidas quanto à
honestidade, na vida pública ou particular, ficha limpíssima: um bando de
celerados, já identificados, de famílias ricas e católicas praticantes, nas
imediações de onde acontecia o velório, gritando ofensas ao parentes do morto,
à memória do morto e espalhando panfletos, afirmando que petista bom é petista
morto.
Desrespeito a cerimônias fúnebres também é crime previsto no
Código Penal.
E nenhuma voz da oposição, para desautorizar a “atitude
heróica” dos manifestantes.
Ficarei nestes dois casos, mas poderia citar dezenas, talvez
centenas, de outros mais, semelhantes ou assemelhados, mas ficarei nestes, o
bastante.
Estive no velório de Edson Luis, secundarista assassinado
pela ditadura, enquanto almoçava, no refeitório estudantil do Calabouço, no
Rio, quando militares invadiram de surpresa, atirando a esmo, para intimidar os
estudantes, em 1968, e houve ódio, mas nem tanto como agora.
Estive na passeata dos cem mil, havia ódio contra o
militares, mas não tanto ódio como agora, de todos contra todos.
Estive nas manifestações da frustração pela reprovação da
Emenda Dante de Oliveira, que restabelecia as eleições diretas, e havia ódio,
mas não como agora.
Nunca vi tamanha radicalização emocional, tanto
passionalismo político, ou, melhor, vi sem compreender: a minha paquidérmica
memória registra que na morte de Getúlio vi muita gente chorando, inclusive
dentro de minha casa, a começar por meu pai, muita gente aturdida, a começar
por minha mãe, e o espocar de fogos, muitos fogos de artifício, sem que até
hoje eu tenha entendido se de homenagem a Getúlio ou comemoração da oposição
conservadora, fascista, corrupta, golpista, como a de 64 e de agora, afinal, eu
só tinha 4 anos.
Mas esta situação não é natural, foi plantada,
planejadamente cultivada, pela mídia, pelas religiões, com pastores demonizando
o que é só humano, com padres fascistas divinizando o que é cesariano, nas
igrejas, com professores e médicos, líderes naturais, sobre as mentes alheias,
incitando ao ódio, os discursos e declarações levianas e descompromissadas de
lideranças vazias, a começar pelo Sr. Aécio Neves, do qual os cariocas têm a
imagem de um jovem alternando surf, drogas e detenções policiais, por arruaças,
chegando à política na sombra de um cadáver, do avô, sem que tenha mudado.
As conseqüências estão aí, mas, como quem com ferro fere...
O ódio já chegou na porta do Congresso Nacional, onde um velho deputado,
pastor, autoridade política e religiosa, foi agredido.
Breve estará lá dentro, na fonte do ódio.
As conseqüências estão aí, quando já não se respeita a
memória de mortos, o dor dos parentes dos mortos e se tripudia até sobre a
morte, evidenciando a vulgarização da morte, pelos fanáticos fabricados, os
robôs movidos a ódio, frankensteins contemporâneos.
Só que o romance Frankenstein, de Mary Shelley, bem desnudou
a alma humana: os anormais, os produtos da maldade e do equívoco sempre se
voltam contra os seus criadores, ou, como afirmou Friederich Nietzche, na
monumental obra Assim Falava Zaratustra, “Mal corresponde ao mestre o que nunca
passa de discípulo”.
Fizeram bons alunos, e se querem uma Síria aqui, sabemos
todos quais serão os alvos primeiros e preferenciais, e se arrependerão do que
fizeram, se tiverem tempo.
Macaé, RJ, 07/10/2015.