(Eduardo Galeano)
"É difícil
fazer um catálogo dos ideais de esquerda. Eu diria que são os mais ligados às
idéias da liberdade, da comunhão com a natureza, da preservação da vida, não só
humana, mas da vida do planeta, que é nossa casa. E é a certeza de que fazemos
parte de um arco-íris de diversas cores e que o racismo está nos deixando cegos
para essa maravilha que é a diversidade humana e da vida no mundo. Porque o
melhor do mundo é a quantidade de mundos que ele contém. Essas seriam algumas
coisas básicas.
Ocorre hoje a
ressurreição dos laços solidários, não digo mortos, mas muito feridos,
quebrados, a partir da imposição de uma escala de valores fundada na salvação
pessoal, na idéia de que o outro é um competidor e um inimigo, não um
companheiro. Que é uma ameaça e não uma promessa. Acredito, como um homem de
esquerda, que alguém sempre tem alguma coisa para dizer que valha a pena
escutar. Os trinta e poucos anos transcorridos desde que escrevi As Veias
Abertas da América Latina indicam que alguns desses valores já não têm a força
que antes tinham. Por exemplo, nos anos 70, ninguém discutia que a pobreza era
filha da injustiça. Era a esquerda quem denunciava, mas ninguém discutia. O
centro aprovava e a direita não discutia, calava a boca. Agora, é uma minoria
que continua acreditando nisso. Para a maioria dos opinion makers, os
fabricantes de opinião do mundo, a pobreza é o castigo que a ineficiência
merece. Isso é uma mudança de valores radical."
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