sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Zé Bolinha quer briga


Zé Bolinha quer briga

(Serra tenta enxergar o mundo real do outro lado do buraco que cavou para si mesmo).

Esse é o tipo de matéria que se você ler enquanto estiver comendo, corre sério risco de se engasgar. Quem esse abestado pensa que é? Mas depois de tossir um pouco e pensar com mais calma, lembramos que o homem teve 44% dos votos e idealizou a campanha mais sórdida da história republicana: o cara é perigoso e saiu da eleição, pelo jeito, ainda mais agressivo e determinado do que nunca. Como observou Wanderley Guilherme dos Santos, ele não abrirá mão do eleitorado de direita que conquistou. Sua aparição surpresa esta semana no Congresso, o espaço que teve na mídia, e as declarações duras que deu contra o governo, mostram que o Zé Bolinha quer briga. E quem quer briga, pode bater, mas também apanha! Comento a matéria abaixo com intervenções entre parênteses no meio do texto.

Matéria publicada no jornal O Globo desta quinta-feira, 25 de novembro de 2010:

Serra alerta sobre ‘herança adversa’

Ex-governador critica Lula e prevê problemas para Dilma na economia

Adriana Vasconcelos

BRASÍLIA. Em sua primeira aparição pública após a derrota sofrida na disputa presidencial, o ex-governador José Serra (PSDB) fez ontem uma advertência sobre a “herança adversa” deixada pelo governo Lula para sua sucessora, Dilma Rousseff, na área econômica. Para Serra, o presidente Lula, em vez de tentar melhorar esse quadro de inflação em alta, taxa de câmbio supervalorizada, contas fiscais maquiadas e atividade econômica em desaceleração, optou por continuar em campanha, já de olho na sucessão de 2014.

- Estou assombrado como um presidente da República, que devia estar governando o país, continue fazendo campanha. É o que, aparentemente, mais Lula sabe fazer na vida: campanha e mentir. Em vez de trabalhar para criar melhores condições para sua sucessora no Brasil, ele continua fazendo campanha e absurdos, como o projeto do trem-bala, que é uma das maiores fraudes em matéria de obras públicas que o Brasil assistiu e que eu espero que não se realize – disparou Serra, durante uma visita ao Senado.

(Serra chama para si, com essas declarações, o papel de líder da oposição. O fato de não ter mandato popular, porém, dificultará a sua performance. Por isso é tão importante para ele se tornar presidente do PSDB, o que lhe garantirá visibilidade, poder e acesso aos recursos – incluindo financeiros – do partido. Mas suas palavras mostram que ele é que ainda está em campanha. Serra tornou-se aquela figura que ao entrar numa sala obriga todos os outros a se retirarem, tamanho é o mal estar que provoca à sua volta. Uma espécie de espantalho político que o PSDB e a mídia de oposição usam para afastar as pessoas do deserto ideológico em que vivem, e que eles tentam vender como jardim do éden. O projeto do trem-bala é absurdo porquê? O mundo inteiro está construindo trem-balas! Por que só o Brasil não pode ter? Por que só aqui é absurdo? Por acaso, o brasileiro tem menos necessidade de deslocamento do que os cidadãos de outras partes do mundo? O trem-bala é um grande avanço! O que não dá é ficarmos dependentes de carro, ônibus e avião, que só gastam petróleo! O trem-bala gasta infinitamente menos combustível. É caro? 33 bilhões é caro? Ora, o Brasil gasta dez vezes isso por ano com juros, isso sim é absurdo! 33 bilhões para construir um trem-bala de última geração, uma obra que representará um ganho fantástico em infra-estrutura, é caro? Serra é uma besta.)

Serra preferiu não opinar sobre os primeiros nomes confirmados para a futura equipe econômica, mas fez questão de enfatizar que eles terão “um nó difícil de desatar” pela frente.

- Quero registrar que a herança que se deixa para o novo governo é adversa. Inflação para cima, produção desacelerando, taxa de câmbio supervalorizada, o déficit em conta corrente é o segundo maior do mundo, ou seja, uma economia repleta de desequilíbrio e contas fiscais maquiadas. É o legado deixado por Lula. Não sei se é maldita, mas é uma herança muito adversa.

(Além de besta, é um reacionário, e agora que precisa mais que nunca da mídia – única que realmente pode levá-lo a presidência do PSDB, visto que não há nada que se pareça a democracia dentro do partido – incorpora de vez o que já era há tempos: um porta-voz, ou melhor, marionete do que pensam os donos de jornal. Mas até aí tudo bem, ele está no seu direito. Ele citou problemas reais da economia brasileira. O que me espanta, porém, é sua absoluta falta de sensibilidade social. Depois de passar a campanha toda falando na necessidade do Estado investir em Saúde, em elevar o salário mínimo para 600 reais e dar décimo terceiro para o bolsa família, o tucano, em sua primeira aparição pública diz que o grande problema do Brasil é o déficit em conta corrente! Ora, os problemas por ele citados existem desde que Portugal dava as ordens por aqui e têm sido justamente os pretextos usados pelos governantes para adiarem ad eternum a solução das mazelas sociais.)

O candidato derrotado do PSDB rebateu ainda pontos da entrevista concedida ontem por Lula a um grupo de blogueiros que ajudaram na campanha de Dilma. A começar pela declaração de Lula de que ele deveria pedir desculpas ao país pelo episódio da bolinha de papel:

- Se alguém deve (desculpas) é o presidente Lula, porque, como foi comprovado, foi um outro objeto atirado em mim e isso, inclusive, está filmado. E o presidente Lula sabe disso. Acontece que o presidente Lula não perde o costume, continua fazendo campanha e talvez já tenha começado sua campanha para 2014 e dizendo mentiras.

(Deve desculpas sim por ter tentado armar um golpe na opinião pública brasileira. Não importa se foram duas, três ou dez bolinhas de papel ou meia dúzia de fitas crepes. O que importa é que não machucou, não teve nada a ver com a campanha de Dilma, e há vários indícios de que foi um golpe planejado, não se sabe se com conhecimento de Serra ou não. O fato do INDIO, no dia seguinte, ter declarado ao microfone que Serra foi agredido com um objeto que pesava “uns dois quilos”, além de toda escandalização midiática por parte de empresas comprometidas com o ideário tucano, reforça essa hipótese.)

Serra também rebateu as acusações de Lula de que teria explorado o acidente da TAM, ocorrido em São Paulo:

- Como governador fui ao local me solidarizar com os familiares e estimular policiais e bombeiros. Já o presidente Lula sumiu do mapa nas primeiras horas, evitou dar entrevistas e desapareceu. O comentário é mal educado e raivoso.

(Cara de pau e mau caráter. Lula foi massacrado no dia seguinte ao acidente. A Folha estampou na PRIMEIRA PÁGINA um artigo, escrito por um psicólogo, que chamava o presidente de assassino. Serra tenta, a posteriori, faturar mais uma vez em cima da tragédia. Como de praxe, Serra distribui adjetivos que mereciam ser aplicados antes a si próprio.)

Sarney, Collor, Marina e Ideli evitam cumprimentá-lo

Serra reuniu-se com parlamentares de oposição e foi ao plenário do Senado, onde o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP) ignorou sua presença. Coube ao líder do DEM, senador José Agripino (RN), anunciar a chegada de Serra. Sarney limitou-se a ouvir o colega, interrompendo-o para anunciar o resultado de uma votação.

O ex-presidente Fernando Collor evitou cumprimentar Serra. Ele e Sarney foram apontados pela campanha tucana como aliados indesejados de Dilma. A senadora Marina Silva (PV) também deixou o plenário sem cumprimentá-lo. A líder do governo no Congresso, senadora Ideli Salvatti (PT-SC), fez careta e se levantou da bancada ao perceber a presença de Serra, que evitou responder se pretende ser candidato novamente.

(Esse parágrafo aí revela bem como Serra tornou-se um espantalho. Ninguém gosta do Serra. Ninguém confia no Serra. Quer dizer, ninguém exceto as famiglias da mídia. E olhe lá – o Estadão escreveu editorial apoiando Serra intitulado “O mal menor”, rs. A menção a postura de Collor, contudo, neutraliza o entendimento, por parte do leitor, de que Serra tornou-se uma figura desagradável, mau cheirosa, incômoda. O mesmo Collor que a mídia lançou mão para derrotar Lula em 1989, há tempos virou uma espécie de Exu, e ainda é usado – ironicamente – contra o PT. Antes, Collor era o caçador de marajás. Agora é o Rasputin de Lula. A mídia não suporta a maturidade e inteligência política de Lula, que sabe que não pode “brigar” ou “ficar de mal” com nenhum senador porque é um chefe de Estado e precisa de TODOS os senadores para aprovar reformas e leis importantes para o país. O problema da mídia é que ela, em vez de procurar aprimorar o entendimento político da população, reforça clichês. Quando lhe convém, usa clichês da própria esquerda, vide a quantidade imensa de vezes que Merval Pereira abriu espaço ao deputado Chico Alencar, sempre, é claro, que interessava ao Globo atacar Lula também pelo flanco oeste. A mídia vende a imagem de que o fato de Collor apoiar Dilma ou Lula é o sinal de que estes adotaram ideias daquele, e não o contrário. Collor (infelizmente) é um senador e como tal é um quadro político importantíssimo à república, para o bem e para o mal – mas é um parlamentar obscuro, sem força partidária, sem influência no governo. E a partir de 2011, com a reconfiguração do senado, que será muito mais “vermelho” que antes, Collor emagrece politicamente. Collor apoia Lula e Dilma porque em caso contrário seria esmagado eleitoralmente em Alagoas, mas as suas ideias estão muito mais ao lado de Serra do que do PT, essa é a verdade que os jornais não dirão, e assim vão fomentando, na cabeça das pessoas, sobretudo os mais jovens, uma mitologia totalmente esquizofrênica, a la Roberto Freire, segundo a qual Serra seria de esquerda e a prova (diz a mitologia) é que Collor não quis cumprimentá-lo.)

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