domingo, 27 de junho de 2010
Cidade Administrativa, a "obra do século", já apresenta rachaduras
Cidade Administrativa, a "obra do século", já apresenta rachaduras
Três meses após a inauguração, nova sede do Governo de Minas, que custou R$ 1,2 bilhão, revela problemas como piso trincado e maçanetas que não mantêm as portas fechadas
Alex Capella - Repórter - 27/06/2010 - 09:40
CRISTIANO COUTO
CIDADE ADMINISTRATIVA
Piso dos pilotis do Palácio Tiradentes está trincado
Para construir a Cidade Administrativa, no Bairro Serra Verde (Região Norte), a tempo de o ex-governador Aécio Neves (PSDB) inaugurá-la, o Governo do Estado declarou um gasto com obras de R$ 948 milhões. Outros R$ 280 milhões foram gastos em serviços e equipamentos contratados por meio de licitações públicas, totalizando R$ 1,2 bilhão. Todo o complexo ergueu-se do chão em menos de 15 meses. Agora, três meses depois da inauguração, o Governo admite gastar nova soma significativa de recursos para corrigir algumas escolhas “infelizes” do projeto arquitetônico, e manter o complexo de pé. A lista de “defeitos” na obra, apontados num check-list preliminar, vai do tipo de piso usado no pilotis dos três prédios principais - cuja granitina apresenta uma série de fissuras -, passando por maçanetas que não mantêm as portas fechadas.
O gasto com a troca do piso é consenso no Governo. Trata-se da mais aparente “falha” no projeto de construção do complexo. As rachaduras levantaram até a suspeita, entre os servidores, de um possível problema estrutural na obra. Engenheiros e arquitetos ouvidos pelo HOJE EM DIA, com base no valor do metro quadrado aplicado com granitina, calculam que o Estado terá um prejuízo de cerca de R$ 1,5 milhão se optar por arrancar o acabamento usado no complexo, fora o investimento no novo piso. O assunto é delicado e vem sendo tratado com cuidado. Afinal, o projeto executivo recebeu a assinatura do arquiteto Oscar Niemeyer. Além disso, a execução dos 310 mil m² de área construída ficou a cargo de nove construtoras: Camargo Corrêa, Santa Bárbara, Mendes Júnior, Odebrecht, Queiroz Galvão, OAS, Andrade Gutierrez, Via Engenharia e Barbosa Mello.
As obras tiveram início em janeiro de 2008 e foram inauguradas por Aécio no dia 4 de março, data do centenário de nascimento de Tancredo Neves (morto em 1985), que dá nome ao complexo. A área requereu grandes esforços de infraestrutura, envolvendo a dragagem do barramento, aterro, escavação e fundações profundas, devido ao solo pantanoso do terreno de 804 mil m2 do antigo Hipódromo Serra Verde. Fora o tempo considerado recorde pelo próprio Governo para uma construção deste porte, o que chama a atenção é a ousadia do projeto.
Do ponto de vista da engenharia, o Palácio Tiradentes é o edifício mais complexo. O prédio de 146 metros de comprimento e 26 metros de largura aparece suspenso por “alças” metálicas presas à cobertura. A construção possibilita um vão livre duas vezes maior do que o do Museu de Arte de São Paulo (Masp), até então, o maior do mundo. E é justamente no piso do pilotis do Palácio Tiradentes onde se encontra o maior problema da obra.
O revestimento com granitina (acabamento argamassado com aparência de granito branco) apresenta rachaduras por todas as partes. Os pisos dos prédios ‘Minas’ e ‘Gerais’, que abrigam as secretarias e demais órgãos do Estado, receberam o mesmo tipo de revestimento, e também apresentam as fissuras. As falhas no piso, conforme interlocutores, incomodaram o governador Antonio Anastasia (PSDB). Diante das reclamações dos servidores, o governador exigiu uma solução junto às construtoras. Pelo contrato, as empresas são responsáveis pela correção das falhas comprovadas na execução do projeto.
Maçanetas que não funcionam e ratos incomodam servidor
Até outubro, a previsão do Governo é de que a Cidade Administrativa reúna 16,3 mil funcionários. Hoje, os cerca de 4 mil servidores que trabalham no complexo já apresentaram seu “check-list” pessoal aos gestores. Nos processos licitatórios conduzidos pela Seplag, uma série de empresas forneceu, aproximadamente, 59 mil itens para rechear o complexo, incluindo móveis, equipamentos e serviços essenciais para as atividades. Entre as principais reclamações dos servidores, estão a falta de molas nas portas dos banheiros, maçanetas que não funcionam e até a presença de ratos.
Conforme o Governo, pelos contratos, está garantido, além do fornecimento e da instalação completa do mobiliário e dos equipamentos, o serviço de garantia e assistência técnica por cinco anos. O Estado espera definir a lista de problemas que precisam ser resolvidos dentro de 90 dias. “Isso é igual à casa da gente. Existem coisas que precisam de manutenção ou de serem trocadas mesmo. No caso das trocas, o Governo terá de fazer novos contratos”, diz o diretor da Codemig, Marcelo Arruda Nacif.
Na licitação do mobiliário, o edital previu a compra de 22 mil cadeiras, 10 mil armários e mil mesas. Com mobiliário e divisórias, o desembolso do Estado foi de R$ 93,9 milhões na aquisição de 58.731 unidades. Na aquisição de 79 máquinas de café, foram gastos R$ 5,7 milhões, contando a distribuição de 3 mil doses mensais por máquina. Para cinco lotes de lixeiras, num total de 11.978 unidades, foram pagos R$ 882,8 mil.
Ainda na área interna dos prédios, os servidores reclamam do barulho feito pelo sistema de esgoto sanitário a vácuo e das portas empenadas. Segundo o “prefeito” do complexo, Reinaldo Alves da Costa Neto, como o vão livre do Edifício Tiradentes não permitia a instalação da rede hidráulica, optou-se por esse sistema a vácuo. “Não é caso de desgaste. As maçanetas, por exemplo, desagradaram aos servidores. Já na porta dos banheiros serão instaladas molas para que elas fiquem sempre fechadas”.
O térreo, em torno das edificações, foi composto por uma laje impermeabilizada e recoberto com grama. Foram plantadas quatro mil árvores. No entanto, o complexo ainda passa a impressão de um imenso descampado.
Construtoras se isentam de responsabilidade
O acabamento do piso dos três pilotis, previsto no projeto do arquiteto Oscar Niemeyer, desde o início, sofreu resistência da equipe de engenheiros. Apesar de o piso ser recomendado para áreas de grande circulação de pessoas, os especialistas acreditam que, hoje, há alternativas mais “eficazes’, tanto do ponto de vista funcional quanto do ponto de vista do custo.
Em reunião que contou com as presenças da secretária de Estado de Planejamento e Gestão, Renata Vilhena, e do diretor da Companhia de Desenvolvimento de Minas Gerais (Codemig), Marcelo Arruda Nacif, o coordenador do projeto de implantação da obra e atual “prefeito” do complexo, Reinaldo Alves da Costa Neto, chegou a justificar o surgimento de “rachaduras” no acabamento do piso em função da escolha “infeliz” do material utilizado.
Diante da própria avaliação do engenheiro, as construtoras consideram que todas as especificações da obra foram seguidas. Com isso, nenhuma empresa teria “obrigação” de arcar com os custos da correção ou da instalação de um novo tipo de piso. Segundo o diretor da construtora Mendes Júnior, Fernando Linhares, a empresa ainda não foi “comunicada” pelo Governo sobre as possíveis falhas na execução do projeto. Mas Linhares, que, ao lado de engenheiros das construtoras Camargo Corrêa e Santa Bárbara foi o responsável pela construção do auditório, do Palácio Tiradentes e pela infraestrutura (abertura de ruas, terraplenagem, conformação de terreno) do complexo, afasta qualquer tipo de erro. “O problema pode estar no tipo de acabamento escolhido, não na execução”.
A discussão sobre quem “pagará a conta” das imperfeições do complexo já cria certo constrangimento entre as empresas e o Governo. Pelos contatos preliminares entre representantes do Governo e das construtoras, houve quem defendesse uma espécie de “divisão dos prejuízos”. Mas as construtoras não querem ceder. Argumentam que não têm responsabilidade sobre a decisão do Governo de mudar o acabamento do piso dos prédios do complexo. Tanto que o presidente da Companhia de Desenvolvimento de Minas Gerais (Codemig), Oswaldo Borges da Costa Filho, empresa de capital misto que arcou com os recursos da obra, admite fazer um “aditivo” nos contratos para a realização dos reparos. “Tudo está caminhando sem qualquer atrito. O Estado pode arcar. Não é nada que vá causar desgaste maior”.
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