quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Moralistas hipócritas


Moralistas hipócritas usam julgamento do mensalão para defender a ditadura


Tenho lido alguns artigos denunciando os arrepios legais no julgamento do mensalão. Pouco importa se existem provas. O que conta mesmo é o espetáculo midiático em torno deste julgamento.


São poucas vozes que se levantam. Qualquer um que ouse manifestar posição divergente ou provocar reflexão diante deste processo é rapidamente acusado de “quadrilheiro”.

Trata-se de uma inquisição, e quem não quiser queimar junto nesta “fogueira santa” deve permanecer em silêncio.

A opinião pública quer se vingar da classe política. Qualquer resultado que não fosse a condenação de todos os réus significaria uma gigantesca pizza servida no Jornal Nacional, com alguns poucos manifestantes vestindo nariz de palhaço e com vassouras nas mãos.

Caso os réus não fossem condenados, o país estaria mais inseguro. As crianças desaprenderiam os nobres valores da sociedade civil brasileira, tão temente a Deus e obcecada pela justiça.

Quanta hipocrisia!

Existem zilhões de comentaristas dizendo as mesmas coisas.

Não faz sentido eu usar este espaço se não for para provocar certas reflexões. Tampouco este blog costuma aliviar com medo da “ditadura do senso comum”.

Mas não vou comentar sobre os absurdos deste processo jurídico. Outros já o fizeram com brilhantismo.

Quero comentar as reações subsequentes à condenação de José Genoíno e José Dirceu.

Estava lendo os comentários dos leitores nos portais dos maiores jornais do Brasil.

Muitos destes leitores faziam protestos muito curiosos.

Não foram poucos os que lamentavam o fato de que a ditadura militar brasileira não tenha executado um número maior de opositores ao regime. Em especial os presos políticos Genoíno e Dirceu.

Não foram poucos os que pediam um desagravo aos militares pela “grande obra” de extermínio de seus inimigos políticos.

Quando digo que tais protestos são curiosos é porque não são poucas as vezes que nos deparamos com acusações de que os governos Lula e Dilma estariam pondo em cheque a democracia, interferindo em nossas instituições republicanas.

Podemos entender que a ideologia difundida pela elite e propagada por alguns de seus empregados é que a democracia não passa de um método de dominação, apenas conveniente quando o grupo político hegemônico for representante direto de seus interesses.

Ou seja, quando o poder está nas mãos da “elite branca” devemos brindar a democracia.

Porém, quando o executivo é ocupado por esta “corja sindical”, clamemos por uma ditadura que venha nos redimir desta “anarquia”.

Para isso vale de tudo. Golpe militar ou “tapetão” judiciário.

Procura-se um general de farda ou um juiz de capa preta. Qualquer coisa serve para colocar as coisas em seus devidos lugares e reacomodar a velha hierarquia social.

O PT cometeu erros graves sim. Gravíssimos. Chegando ao executivo, acreditou que seu poder seria suficiente para subjugar a velha classe política tradicional. Imaginou que o apoio financeiro e político aos partidos da base seriam suficientes para ganhar a obediência das velhas raposas.

Como se não houvesse reles traições no meio do caminho.

Mas este grave erro é antecedido por outro ainda mais sério, e espero que o PT aprenda com ele.

O PT realmente acreditou que poderia se articular com a elite e controlar parte dela. Imaginou que a força do governo – com seu potencial político e econômico - permitiriam estabelecer uma agenda comum com a grande mídia. Ao controlar a economia, mantendo as bases do “acordo” do Estado com o Mercado, acreditou que as velhas forças se engajariam no projeto nacional do novo governo.

Besteira!

A relação da elite com o petismo é meramente funcional.

A velha elite se articula com o governo simplesmente porque precisa dele para manter as bases de seu domínio, porém não o reconhece como seu.

Frequentaram durante um período os mesmos salões, mas na primeira oportunidade que tiveram, lançaram mão dos recursos disponíveis para colocar na cadeia aqueles que ousaram submete-los ao seu projeto.

E a classe média?

Ah, a classe média, como sempre incorporando como seu o projeto da classe dominante. Ainda que seja em seu próprio prejuízo. Tudo para não se aliar com a classe pobre. Seria terrível ser ultrapassada na escala social por esta gentalha.

E a classe média jamais perdoará Lula e o PT por subverter a velha hierarquia das castas brasileiras.

É mentira que os moralistas estejam preocupados com a corrupção!

Se assim fosse, jamais teriam sustentado tantos coronéis no poder durante tanto tempo. Quando os escândalos eram contra a velha classe política, os moralistas achavam até graça. Riam porque ninguém nunca conseguia provar nada contra o Dr. Fulano de Tal. Criaram até o slogan do “rouba, mas faz”.

Se os moralistas estivessem realmente preocupados com o bom uso do dinheiro público, não fecharia seus olhos diante dos bilhões que escorrem dos cofres públicos todos os meses para financiar os bancos.

Se estivessem realmente atentos, fiscalizariam o volume de publicidade pública na grande imprensa. Dinheiro para pagar o arrego dos governos aos verdadeiros donos do poder.

Por que a privataria tucana nunca foi motivo de indignação destes moralistas dos dias de hoje? Não faltaram gravações, documentos, provas e resultados econômicos para comprovar o roubo destas privatizações.

De Pedro Alvarez Cabral até os dias de hoje, nenhum roubo lesou tanto esta nação como as privatizações, do jeito que foram realizadas.

Por que esta classe de moralistas sente-se ofendida com a “bolsa esmola” que o governo usa para “sustentar os vagabundos que não querem trabalhar”? Por que ajudar os miseráveis agride tanto, quando os governos do mundo todo (inclusive o nosso) não se cansam de ajudar os bancos e as multinacionais, com a justificativa de salvar a economia mundial?

É tudo mentira!

A questão aqui é política!

Para os moralistas, tanto faz se um governo seja ladrão ou não.

O problema é que os “corruptos” da vez ousaram subverter a velha hierarquia. Fizeram da política seu ofício enquanto todos os outros trabalhavam obedientemente. Converteram-se em chefes enquanto todo mundo continuava cumprindo ordens.

Por isso a condenação foi “merecida”.

Aliás, deveriam ter sido eliminados décadas atrás pela ditadura que garantia a “ordem das coisas”.

Para quem se sente humilhado no dia-a-dia, mas obedece caninamente seus patrões na esperança de algum bem-estar e segurança, ainda que ilusórios, nada é mais irritante do que o “irmão rebelde”. Nada mais recompensador do que um “pai” enérgico que faça justiça ao seu esforço e lealdade e coloque as coisas em seu devido lugar.

Sonham com uma ditadura que venha redimir a frustração que sentem ao perceberem que foram excessivamente estúpidos e recalcados durante suas vidas.

 Moralistas hipócritas!
Postado por Blog do Rafael Castilho 

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