Muitas vezes,
relações marcadas pelo conflito. Esse é o cotidiano de muitos pais que dividem
com os avós a tarefa de educar as crianças. Para a educadora Tânia Zagury, toda
a diferença de métodos para bem educar acaba evidenciada pela diferença de
gerações entre os pais e avós das crianças. Singularidades que podem atrapalhar,
quando não compreendidas. Mas que também podem se transformar em uma rica
experiência.
Andréa Antunes
Entre tantos
pedagogismos e tantas teorias educacionais, em um ponto parece que há consenso:
na regra geral, a avó representa um insubstituível elo afetivo na corrente
familiar e isso tem seus reflexos positivos, quando se sabe que o componente
emocional é um dos vetores básicos no processo de aprendizagem e socialização
das crianças.
Esse papel
ainda continua sendo muito consistente no meio de muitas famílias, sobretudo
diante da complexidade social que, em alguns casos, tem fragilizado o papel dos
pais, massacrados pela correia da cidade grande e pela luta desvairada da
sobrevivência, ou então pela programação intensiva da televisão, o que lhes subtrai
o tempo disponível para o diálogo rotineiro e necessário com os filhos.
Tempos de avó
O perfil de
uma avó que se desdobra no seu papel pode ser exemplificado na figura de Dona
Néia Oliveira, 66 anos. Ela consegue conciliar as tarefas de trabalho (faz
massas para vender) com as tarefas de casa e sempre encontra tempo para a
convivência no dia-a-dia com os netos. Entre carinhos, mimos e brincadeiras,
ela ajuda na educação dos netos Danielle Soares (6 anos), João Pedro (9 anos),
Julianne (5 anos) e Evelyn (14 anos). E como ela, muitas outras avós
desempenham um papel fundamental nessa educação familiar, um pilar mais forte
que a educação formal na escola.
Filósofa e
mestre em educação, autora de nove livros sobre o assunto, Tânia Zagury é
categórica. “O papel da avó e ser avó. É dar carinho, contar histórias. A avó é
para ter prazer com as crianças”, diz Tânia, ressaltando que a avó desempenha
um papel fundamental na formação das crianças. “Elas dão uma noção mais ampla
de família e permitem à criança saber que tem uma história. A relação com a avó
é de uma intensa troca de afeto. A criança se sente amada, valorizada e isso
ajuda a desenvolver a auto-estima”, avalia a especialista.
Avós e mães:
uma relação delicada.
De onde vem,
então, o conhecido ditado “Mãe educa e avó deseduca”? A lógica do pensamento é
simples. As avós capricham nos mimos e agrados, e as crianças têm satisfeitas
todas as suas vontades e caprichos.
Para os pais sobra um papel bem menos
simpático: cobranças, broncas e proibições. Mas mesmo as avós “subversivas”,
que tratam os netos como deuses, não comprometem à formação. Isto mesmo quando
a atitude de fazer todas as vontades do neto, invariavelmente, termina em
conflitos familiares.
“A avó não vai
fazer nada que prejudique a criança. Também não se pode achar que a avó vai
educá-la como se fosse a própria mãe. Ela pertence a outra geração, com outros
valores, e é preciso compreender isso. Mas, mesmo quando faz todas as vontades
do neto, a avó não está prejudicando. A criança tem discernimento para saber
que, com a avó, o comportamento deve ser um, e com a mãe as regras são outras.
O importante é ver a essência do processo”, diz Tânia.
A diferença de
geração, no entanto, nem sempre atrapalha. No caso de dona Néia, a filha Lúcia
reconhece que a mãe é a responsável pela educação mais formal da filha Daniele
e dos sobrinhos. “Minha mãe dá aquela educação mais antiga. Ensina as crianças
a respeitarem os mais velhos, a tomarem benção. Minha filha só toma benção da
minha mãe. Eu não tenho tempo e não dou muita importância para certas
tradições”, revela Lúcia.
Dona Néia
admite que é rígida na educação de hoje, onde os filhos chamam os pais de você,
respondem e fazem bagunça o tempo todo. "Essa história de liberdade é
porque os pais não querem perder tempo educando. Mas comigo é diferente. Não
podemos maltratar as crianças, mas temos que educá-las”, afirma.
São comuns
casos como este, onde a liberdade quase total é dada pelos pais e não pelos
avós. Mas isto tem explicação. De acordo com Tânia Zagury esta é, às vezes, a
forma encontrada pelos pais de compensar a ausência. “Estamos vivendo uma
inversão social, na medida em que o Estado não criou estrutura para que as mães
possam cuidar dos filhos. Hoje, como as mulheres estão inseridas no mercado de
trabalho, acabam tendo que deixar os filhos com a avó. Quando a mãe trabalha
fora se sente um pouco culpada. Então, para compensar, é ela quem faz todas as
vontades da criança. Ela fica ansiosa e quer controlar tudo. Isso também acaba
gerando conflitos” explica a mestre em educação, lembrando que este tipo de
problema é fácil de evitar. “O excesso de liberdade e pequenos erros, cometidos
pela avó ou pela mãe, podem ser resolvidos com uma boa conversa, com muito
diálogo.”
Corujas, mas
nem tanto.
A especialista
tem razão. Por mais que façam as vontades dos netos, as avós não fogem da
tarefa e educar. Mesmo aquelas que só ficam com o neto de vez em quando.
Yolanda Carvalho, 71 anos, é um exemplo disso. Só fica com as crianças quando a
filha precisa, mas nem por isso faz todas as vontades.
“Minha filha
não trabalha. Quando ela tem alguma coisa para revolver eu fico com as
crianças. Mas não é por isso que deixo eles fazerem tudo o que querem. Fico
atenta a tudo que estão fazendo e, se tiver alguma coisa errada, corrijo. Brigo
mesmo. Minha filha não reclama. Também, se reclamar, não fico mais com as
crianças. Acho que se ela quer que eu tome conta, tem que me dar liberdade para
educar”, conta Yolanda, do alto da experiência de quem criou três filhos e,
agora, ajuda a cuidar de dois netos: André e Renata Peçanha, de 7 e 5 anos.
Dia das avós
Mas, se entre
pais e avós a relação é delicada, entre avós e netos a coisa parece ser mais
simples. Mesmo sem ser aquela avó que faz todas as vontades, dona Néia é amada
pelas crianças. Quando o tema em questão é o desempenho da vovó, elas não
poupam elogios – deixando transparecer uma evidente dose de ciúmes.
“Ela briga,
mas é legal”, diz João Pedro. Sem querer ficar para trás, Danielle logo dá sua
opinião. “Ela ensina muita coisa e ajuda a gente”, diz. Evelyn Cristina também
não vê problema em ficar com a avó. “Ela cuida muito bem da gente”, avalia. Mas
a melhor resposta parece vir da pequena Julianne. Questionada sobre a relação
com Dona Néia, prefere o silêncio. Apenas corre para beijar a avó.
“As avós dão
uma noção mais ampla de
família e permitem à criança saber
que tem uma história. É
uma intensa troca de afeto.”
Tânia Zagury
Uma relação de
pura amizade. Com açúcar e com afeto.
Cabeça branca,
óculos, cestinha de costura no colo. Esta é a apresentação de Dona Benta no
primeiro parágrafo do livro Reinações de Narizinho. Nas histórias infantis de
Monteiro Lobato, a avó encarna a figura de educadora cuidando dos netos,
Pedrinho e Narizinho, que vão passar férias em seu sítio. Nas páginas do autor
não há conflito entre mãe e avó, já que a figura materna sequer é apresentada.
Nas lembranças de muitos adultos de hoje ficam, além dos contos do Sítio,
recordações de vovó de verdade, que se esmeravam na tarefa de contar história e
fazer muitos – mas muitos – bolos e quitutes.
Contudo, a
realidade da convivência em família nem sempre é tão doce. Às vezes, a relação
entre mães e avós não é pacífica. Os conflitos são freqüentes em alguns
relacionamentos, onde existe até uma disputa pela atenção da criança. Logo, um
convívio tranqüilo exige “jogo de cintura” de ambas as partes. Porém, donas de
uma experiência e conhecimento invejáveis, afinal já educaram seus filhos, as
avós podem contribuir ainda mais para a convivência harmônica.
Para isso,
elas devem seguir algumas regras consideradas básicas para melhorar a relação
entre gerações e que prometem encerrar conflitos familiares. Quem já seguiu a
cartilha da vovó ideal recomenda.
Confira alguns mandamentos da avó perfeita
para pais e netos:
1-Amar os
netinhos. Este é fácil e geralmente cumprido com eficiência.
2-Colaborar com
os pais na educação.
3-Para facilitar
isto o ideal é uma boa conversa para saber o que os pais querem.
4-Dar mais
sugestão e menos conselhos aos pais.
5-Não competir
com os pais pela atenção das crianças. Às vezes é deflagrada uma batalha não
declarada.
6-Consolar os
netos sem desautorizar os pais, mesmo que acredite que eles estejam errados.
7-Ouvir os netos
para que eles se sintam compreendidos.
8-Contar
histórias que sejam agradáveis.
9-Fazer bolos,
doces e salgados que ficarão para sempre na memória.
Nenhum comentário:
Postar um comentário