sociólogo Domenico De Mais
O sociólogo
falou de assuntos como o impeachment da presidente Dilma Rousseff, a
transformação dela e de Lula em "delinquentes". Não existe um único
sonho. Cada classe social tem o seu. Na favela o sonho é a instrução ou comer.
O sonho global
do Brasil corresponde a se tornar uma nação capaz de dar um grande modelo de
vida ao mundo. A sociedade pós-industrial, diferentemente das precedentes, é
sem modelo. O Brasil há 500 anos vem imitando a Europa e os EUA. E não tem que
copiar. É obrigado a criar um modelo.
O Brasil é
um pouco infantil. Porque no fim de 2014 Lula era um grande personagem e Dilma
também. Passado 2014, Lula é um delinquente e Dilma também. Essa transição foi
rápida, uma transição infantil. Não foi madura.
Por quê
[isso ocorreu]? Não sei. Olhando da Europa, lembro que durante o período de
Lula o Brasil era feliz. Ele era um mito, as pessoas choravam diante dele.
Dilma era um mito também no primeiro mandato. Porém em dois meses Dilma passa a
ser odiada. Quem olha de fora não entende. Só um povo infantil faria uma coisa
dessa.
O modelo de
sociedade não deriva da elite, mas da cultura popular. E a cultura popular do
Brasil tem grandes valores, como o de acolher bem. A Europa está demonstrando
que não acolhe bem imigrantes. Só os brasileiros não amam o Brasil. Não sou eu
que digo isso, é Nelson Rodrigues. O Brasil não é popular no Brasil. Sobretudo
entre a elite.
OS
INTELECTUAIS
Há duas
características: uma grande inteligência social e uma grande coragem. Os
intelectuais brasileiros têm o dever de ter a consciência da importância do
Brasil. São muito críticos ao país, e uma crítica global, não de classe.
Intelectuais passados, Gilberto Freyre, Darcy Ribeiro, eram críticos à elite,
mas orgulhosos do modelo brasileiro.
Fiquei muito
contente quando o Brasil perdeu de 7 a 1 para a Alemanha. Pensei: chega ao fim
esse mito do futebol. O Brasil tem tantas coisas maravilhosas. A dança, a
literatura, a pintura, a arquitetura, o cinema, a sociologia. Cito Fernando
Henrique [Cardoso]. Quando eu era professor da Universidade de Nápoles, usava
os livros dele. Os alunos não o conheciam, e ele é importante. Não é que o povo
brasileiro tem complexo de vira-lata. São os intelectuais que têm. Um morador
da favela não tem complexo de vira-lata.
A CORRUPÇÃO
É
interessante porque o Brasil descobriu pela primeira vez em sua história a
corrupção. Que maravilhoso, porque o mundo conhece a corrupção desde sempre.
Desde as obras de Shakespeare, Ésquilo, Sófocles. E o Brasil descobriu em 2014
[irônico], com Dilma. Acredito que há corruptos aqui desde o início. Estava no
Rio e assisti ao último debate de 2014, com Aécio Neves, Dilma, Marina Silva.
[Com expressão de incredulidade] Nenhum candidato disse a Dilma que ela era
corrupta. Em dois meses, "pá", "pá" [faz gesto com os
braços para indicar mudança de lado]. Foi de repente.
OS LIBERAIS
É um
problema mundial: o grande retorno do neoliberalismo. Em todo o mundo há uma
reação contra governos de esquerda. É uma coisa muito interessante, que como
sociólogo percebo, mas não consigo explicar. No Brasil houve também um trabalho
midiático. Em dois, três meses, tudo foi feito [no impeachment].
A RUA
Foram
consequência do trabalho da mídia [os protestos contra Dilma]. Era
organizadíssimo! Esse foi o grande triunfo midiático do mundo!
OS MONSTROS
Não entendo
de modo ofensivo dizer que o Brasil age de modo infantil. É uma constatação, de
uma presença muito forte do estômago em detrimento da cabeça. Diz-se que
"o sono da razão gera monstros". Se só funciona o coração, surgem os
monstros. Como Hitler, Mussolini. Quando se inicia um movimento de grande
emotividade, é um momento muito perigoso.
OS POBRES
Hoje o
Brasil está precisando de uma forte reflexão. Há um número de pobres altíssimo.
E eles não têm uma voz. Não há um papa Francisco aqui. Lula foi a grande voz
dos pobres, quando era sindicalista. A última coisa que foi retirada do pobre
foi Lula.
OS RICOS
É a grande
vitória dos ricos sobre os pobres do Brasil. Desmitificar Lula é um crime.
Mesmo que ele fosse um criminoso. Mandar policiais levarem Lula para depor [a
condução coercitiva dele, em março] é tolher um mito. É um crime.
O
IMPEACHMENT
Não sei. Mas
é estranho que um povo mude de ideia em dois meses. A impressão externa é que
foi um golpe. Mas eu acredito que a dinâmica mudou. Até o que se entendia como
golpe mudou. Quando se diz essa palavra, se pensa em militares, de noite, com
tanques. Mas um golpe se prepara também pelos jornais, pela televisão.
A JUSTIÇA
A Operação
Mãos Limpas levou a uma limpeza da classe política italiana. Mas é um modelo
que fica nos limites da democracia.
Quem tirou a
maior vantagem foi [Silvio] Berlusconi. E ele foi para a Itália uma tragédia!
Foram 20 anos do fascismo de Mussolini e depois 20 anos de Berlusconi. Mas
Berlusconi não era Mussolini. Esse é o fato positivo, mas também o negativo.
Porque não foi criada uma resistência. Quando há um ditador, há resistência.
Mas, se não é ditadura...
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