sábado, 9 de dezembro de 2017

O QUE É SER SOCIALISTA? AINDA FAZ SENTIDO SER DE ESQUERDA ?



Por Afrânio Silva Jardim

1 - POUCO ADIANTA, MAS NÃO DESISTIREMOS
Na verdade, o mundo sempre esteve dividido entre pessoas que só pensam em si e pessoas que se preocupam com a desgraça dos outros. A falta de informação ou informação deturpada impedem a divulgação dos melhores valores, fundantes de uma sociedade mais justa. A questão é ideológica.
Embora tenha nascido em um lar privilegiado, sempre pugnei por justiça social. Agradeço ao meu falecido pai por ter despertado em mim essa consciência crítica. Embora corra o risco de cair num reprovável maniqueísmo, digo que se trata de uma luta da solidariedade contra o egoísmo.
Pode ser até utopia ou romantismo juvenil, mas é a utopia que nos faz caminhar, como dizia Eduardo Galeano.
O mundo já foi muito pior (mataram quase todos os índios e escravizaram os negros e o racismo e a cobiça dizimaram civilizações). Graça à luta contra os egoístas, o mundo melhorou e, algum dia, a solidariedade, e não a competição, fará surgir um novo ser humano. Como disse Leon Gieco, em uma das suas belas músicas, "há de vir uma nova cultura".
A nossa esperança é que, ao menos, todos tenham as mesmas oportunidades. Que os filhos da minha empregada doméstica tenham as mesmas oportunidades sociais que meus filhos, vale dizer, que o filho do empregado não nasça empregado e que o filho do patrão não nasça patrão.
Enfim, desejo que consigamos vencer este trágico determinismo de uma sociedade profundamente injusta e indiferente à dor dos outros. Que jamais uma criança morra nos braços de sua mãe em razão de falta de recursos para o seu tratamento médico, enquanto outros jogam "dinheiro pelo ralo".
O grande desafio é lograr um novo modelo de sociedade, onde todos tenham, pelo menos, as mesmas oportunidades de ascensão social, sem que tenhamos um governo de matiz autoritária. O presidente Allende tentou no Chile e não conseguiu. Na Venezuela, o boicote da classe empresarial está inviabilizando a efetividade de um governo popular (diferente de populista). Como convencer a quem tem privilégios a abrir mão deles, de forma pacífica??? Entretanto, a ideia de um socialismo democrático não deve ser abandonada.
2 – PORQUE SOU DE ESQUERDA
O pensamento de esquerda prioriza a justiça social, sustentando que o Estado Popular deve assegurar, no mínimo, as mesmas oportunidades para todos.
Para isso, os chamados "bens de produção" devem ser gerenciados pelos trabalhadores, que são aqueles que realmente produzem a riqueza. As riquezas produzidas pela mão dos trabalhadores e trabalhadoras devem ser distribuídas e não concentradas nas mãos de uns poucos. Ninguém pode explorar o trabalho alheio.
Os valores da esquerda são a solidariedade e igualdade. Busca-se uma sociedade justa, sem explorados e exploradores.
Já a chamada "direita" privilegia a competição e a concorrência na sociedade. É individualista.
Acredita que a livre iniciativa na economia vai fazer a sociedade se desenvolver. Aposta no lucro, na cobiça, embora acredite que os empresários são "bondosos", pois criam empregos. Querem liberdade na economia, mas são "castradores" no que diz respeito à evolução dos costumes na sociedade. Neste particular, quase sempre a direita é conservadora ou mesmo reacionária.
A direita fala em total liberdade. Entretanto, tal liberdade é meramente abstrata pois, no mais das vezes, não é o Estado que a subtrai. No dia a dia das pessoas, a liberdade é suprimida pela relação privada de emprego.
Através do contrato de trabalho, mormente em uma sociedade onde não há pleno emprego, tenho que obedecer ao meu patrão, tenho que a ele ser submisso.
Muitas vezes, se o empregado não for um "bajulador" do seu patrão, pode ser colocado no "mar da amargura". As pessoas saem de casa com o risco de voltarem desempregadas.
Isto não ocorre com os funcionários concursados, que têm estabilidade no serviço público ou em uma sociedade coletivizada, onde o patrão seja uma cooperativa de trabalhadores.
Minha empregada doméstica tem liberdade para viajar para Paris ou Londres. Entretanto, ela pode efetivamente exercer esta liberdade?
Posso dizer o que desejo aqui, atingindo centenas de pessoas. Entretanto, de noite, a TV Globo destrói tudo, atingindo mais de 20 milhões de pessoas ...
Dizem que antes de distribuir, é preciso fazer "crescer o bolo". Sucede que raramente o "bolo cresce" e, quando cresce, eles não querem distribuir...
A esquerda pode ser um pouco utópica, mas a "poesia" está com ela. A direita aposta no egoísmo do ser humano, cria uma sociedade individualista e indiferente à dor alheia. Um verdadeiro "darwinismo" social. Que vençam os mais astutos, os mais aptos ou os mais "fortes"!
Esta, evidentemente, é a minha avaliação. Avaliação de alguém que sempre se negou a aceitar uma sociedade onde crianças peguem comida no lixo e mães assistem a seus filhos morrerem por falta de dinheiro para tratá-los das suas doenças graves. Não me conformo com esta miséria, embora este "sistema econômico" sempre me tenha sido favorável. Por isso, julgo ter legitimidade para criticá-lo: não falo em causa própria (ao contrário).
Enfim, por tudo isso, me insiro no pensamento de esquerda. O grande problema é conseguir uma sociedade justa sem sacrificar a liberdade individual, efetiva e concreta, pois ninguém abre mão de seus privilégios senão pela coerção.
A utopia é como o horizonte; está sempre distante. Entretanto, ela é que nos faz caminhar, (conforme texto citado pelo saudoso pensador Eduardo Galeano). Caminhemos sempre ...
Afranio Silva Jardim, professor associado de Direito Processual Penal da Uerj. Mestre e Livre –Docente em Direito Processual (Uerj)

domingo, 3 de dezembro de 2017

PT velho de guerra

Por Gustavo Conde



"Nunca pensei que a imagem do PT fosse reconstituída de maneira tão rápida. É impressionante. O golpe fez um favor sensacional à esquerda (só os esquerdistas fajutos acham que não; porque esquerdista, meu caro, pensa sempre na vitória, não na derrota).

Depois de 16 anos no poder, se o PT saísse "democraticamente" como só acontece nas boas democracias, em 2018, ele sairia desestruturado simbolicamente. Seria muito difícil recompor quadros e projetos, ainda mais com um país modificado (para melhor).

Provavelmente, o PT dividir-se-ia, não em dois, mas em vários partidos, em vários projetos distintos. Mas, não. Interromperam esse processo natural da história. Fizeram um favor ao
PT velho de guerra (o que, sinceramente, não sei se é bom; só sei que é fato).

O PT voltou a ser o partido do povo. Não que ele tivesse deixado de ser. A "imagem" dele deixou de ser, uma vez que foram 13 anos de imprensa ultraconservadora martelando e o próprio desdobramento natural que se dá quando um partido cria raízes no governo. Essa ruptura institucional drástica já impregnou o inconsciente da população brasileira como injustiça e como golpe.

Nem falo da percepção prospectada nas pesquisas. Não confio muito em pesquisas. Falo da percepção real, no dia a dia. De uns tempos para cá, nas padarias, nos postos de gasolina, nas feiras, em qualquer lugar que atenda pelo nome de "popular", as pessoas manifestam seu horror ao que aí está como cenário político e dizem comovidas "como era melhor antes".

Eu converso com as pessoas, adoro. Aprendo muito mais do que lendo a Folha (que leio porque tenho fetiche e para preparar aulas de redação usando seus textos como exemplos negativos). Enfim, a canoa virou e agora falta combinar com os russos.

A sensação é muito boa. É bom ver que o PT, esse partido que dominou todos os corações durante tanto tempo, que representou um jeito diferente de lidar com o poder público, com a própria eleição, com a própria democracia, voltou a ser o partido do povo, o partido que materializa todas as demandas da maioria da população. Mais um pouco e "ser petista" voltará a ser moda, como nos anos 80.

Aliás, é daí que vem toda essa "frustração difusa" da classe média com o PT. Eles embarcaram nos anos 80 por puro modismo: era chique ser petista. Aquela adesão, portanto, foi completamente vazia. Era um bando de tucanos enrustidos - perdão - que queriam parecer inteligentes.

Data vênia, podem vender a Petrobrás, a Caixa Econômica, o Banco do Brasil, as Eletrobrás, Itaipu, o raio que os parta. A gente reconstrói tudo de novo e melhor.

É bom lembrar um dos significados de se entender como uma pessoa de "esquerda": uma pessoa de esquerda tem esperança e não lida com a frustração fruto de incompetência e preguiça intelectual. A esquerda FAZ. Elabora, projeta, reage, luta, dá as caras, cria, faz arte, canta, comemora, celebra, transa. Nunca é demais lembrar de tudo isso."